Inteligência Artificial no Direito: riscos e oportunidades para a advocacia
A chegada da inteligência artificial aos tribunais e escritórios de advocacia abre novas possibilidades, mas também traz preocupações éticas, técnicas e sociais que desafiam a profissão.

Por Dante Navarro
O avanço da inteligência artificial no mundo jurídico
A inteligência artificial no Direito deixou de ser apenas uma tendência para se tornar uma realidade presente em diversos países, inclusive no Brasil. Ferramentas de automação jurídica, análise de documentos, predição de sentenças e até mesmo plataformas de consultoria virtual já fazem parte do cotidiano de advogados e tribunais.
Esse movimento tem sido acelerado pela transformação digital, pelo aumento no volume de informações jurídicas e pela busca de soluções mais rápidas e econômicas para a resolução de conflitos. A advocacia, que por séculos se manteve baseada em práticas manuais e presenciais, agora enfrenta um cenário em que a tecnologia desafia os limites tradicionais da profissão.
Os tribunais também já utilizam sistemas de inteligência artificial para otimizar o andamento processual. Alguns exemplos incluem o uso de algoritmos para triagem de processos e identificação de demandas repetitivas, reduzindo custos e acelerando julgamentos.
No entanto, esse avanço não é isento de riscos. O impacto da inteligência artificial sobre a advocacia vai além da inovação tecnológica: envolve questões de ética, sigilo profissional, proteção de dados e até mesmo a possibilidade de desvalorização do trabalho humano.
Riscos da inteligência artificial para a advocacia
Apesar de suas vantagens, a implementação da inteligência artificial no Direito levanta preocupações legítimas entre advogados e juristas. O primeiro risco é o da substituição de atividades tradicionalmente exercidas por profissionais humanos. Tarefas como elaboração de petições simples, análise de contratos e pesquisas jurisprudenciais podem ser cada vez mais automatizadas, reduzindo a demanda por serviços básicos.
Outro desafio está relacionado à responsabilidade profissional. Quem deve responder por um erro de um sistema de inteligência artificial? A empresa que desenvolveu a tecnologia, o advogado que a utilizou ou o cliente que contratou o serviço? Essa zona cinzenta jurídica precisa ser discutida para evitar insegurança e injustiças.
Há ainda o problema da opacidade dos algoritmos, também conhecida como “caixa-preta”. Muitos sistemas de inteligência artificial operam sem transparência, tornando difícil verificar como chegam às suas conclusões. Isso é especialmente grave no Direito, onde a fundamentação das decisões é um princípio essencial da Justiça.
Por fim, não se pode ignorar os riscos ligados à proteção de dados sensíveis. A advocacia trabalha diariamente com informações confidenciais de clientes, empresas e órgãos públicos. O uso de sistemas automatizados sem os devidos cuidados pode expor dados estratégicos e comprometer a confiança no exercício profissional.
Oportunidades para a advocacia diante da transformação digital
Apesar dos riscos, a inteligência artificial também traz grandes oportunidades para a advocacia. Uma das principais é a possibilidade de aumentar a produtividade dos escritórios. Ao automatizar tarefas repetitivas, os advogados podem concentrar seu tempo em atividades de maior valor agregado, como estratégia, negociação e argumentação jurídica.
Outro ponto positivo é a democratização do acesso à Justiça. Sistemas baseados em inteligência artificial podem reduzir custos e oferecer serviços jurídicos mais acessíveis a pequenas empresas e pessoas de baixa renda, ampliando o alcance da advocacia.
A inteligência artificial também pode ser uma aliada na análise de grandes volumes de dados jurídicos. Ferramentas avançadas conseguem identificar tendências em decisões judiciais, oferecendo aos advogados informações estratégicas para orientar suas causas. Isso pode aumentar as chances de êxito em litígios complexos.
Além disso, a integração da inteligência artificial com áreas como compliance, direito tributário e direito empresarial abre espaço para novas formas de consultoria preventiva. Advogados que dominarem essas tecnologias estarão mais preparados para oferecer soluções inovadoras a seus clientes, fortalecendo sua posição no mercado.
O papel da advocacia na era da inteligência artificial
Diante desse cenário, é essencial que a advocacia adote uma postura equilibrada: aproveitar os benefícios da inteligência artificial sem abrir mão dos princípios éticos e da centralidade do ser humano no processo jurídico.
A Ordem dos Advogados, associações e instituições de ensino jurídico têm a responsabilidade de preparar profissionais para lidar com essas novas ferramentas. Cursos de atualização, debates sobre regulação da inteligência artificial e a inclusão do tema nas faculdades de Direito são passos indispensáveis para formar uma advocacia capaz de enfrentar os desafios tecnológicos.
Outro ponto crucial é o respeito às prerrogativas da advocacia. Nenhuma tecnologia pode substituir a função essencial do advogado como garantidor da cidadania e defensor dos direitos fundamentais. A inteligência artificial deve ser vista como um instrumento de apoio, e não como substituto da prática profissional.
Por fim, é preciso lembrar que a ética deve nortear qualquer inovação. A utilização de algoritmos para análise de provas, predição de sentenças ou automatização de pareceres jurídicos não pode comprometer o devido processo legal e o direito à ampla defesa. A tecnologia deve estar a serviço da Justiça, e não o contrário.
Conclusão
A inteligência artificial no Direito representa um dos maiores desafios e, ao mesmo tempo, uma das maiores oportunidades da advocacia contemporânea. O futuro dependerá da capacidade dos profissionais e instituições em equilibrar inovação tecnológica com a preservação da ética, da dignidade da pessoa humana e da função social do Direito.
A advocacia que souber se adaptar a esse novo cenário terá muito a ganhar. Já aqueles que resistirem à transformação digital correm o risco de perder relevância. Em qualquer hipótese, a inteligência artificial veio para ficar, e o papel do advogado será garantir que ela sirva ao propósito maior da Justiça: proteger direitos e promover igualdade.
Dante Navarro é jornalista, editor-chefe do Pauta Brasil